sexta-feira, 28 de junho de 2013

A nobre verdade do Buda


Quero iniciar esse artigo com uma pequena confissão. Quando era adolescente, eu era, como a maioria dos jovens americanos, muito interessado em religiões e filosofias orientais. As crenças sobre humanidade, realidade e divindade dos sistemas religiosos como no Hinduísmo, Taoísmo e Budismo apresentavam algo muito mais profundo do que a escassez espiritual do Ocidente.

Como de regra, as religiões orientais enfatizavam grandes tradições místicas, contrastando o “deus tirano” apresentado pelo cristianismo americano, além de serem muito mais simpatizantes dos conhecimentos científicos em geral.

Enquanto o Cristianismo era a morada das Cruzadas, Inquisição e pastores fundamentalistas, o Budismo, Hinduísmo e Taoísmo, eram tratados como tendo sua profunda visão sobre a natureza do mundo e da humanidade, eram sobre ser gentil e espiritual.

Este é o argumento mais utilizado por apologistas das religiões orientais para o público ocidental, e era este o ponto de vista que eu tinha até encontrar a Igreja Ortodoxa e seu riquíssimo legado espiritual.

O objetivo deste artigo não é refutar estas noções comuns sobre religiões orientais nem sobre os mitos que a ignorância acusa o cristianismo. Até porque, em artigos passados, já tratei de como a Ortodoxia refuta todos estes mitos.

Só citei estes estereótipos sobre cristianismo e religiões orientais para apresentar um pano de fundo no que segue adiante.

Do outro lado do Éden

Dentre tais religiões orientais, era o Budismo que especialmente me atraía. O próprio Buda era, para mim, uma figura incrível em várias formas: sua determinação em “ou o Nirvana ou Nada”, sua busca espiritual pela verdade, sua compaixão abrangente pelo mundo, sua sistemática e científica cosmovisão e principalmente, sua orientação espiritual para as pessoas me fascinavam. E ainda me fascinam.

Aqui está outra confissão: Eu ainda acredito que o Buda estava certo. Isto mesmo, eu sou Cristão Ortodoxo e continuo acreditando que Buda estava correto em sua visão de mundo e do homem. Em verdade, ter-me tornado Cristão Ortodoxo me fez apreciar ainda mais a profundidade e verdade que o Budismo apresenta mais do que na minha vã curiosidade de adolescente. Eu explicarei:

Budismo é diferente mesmo das outras religiões orientais em muitos aspectos, provavelmente uma das mais incríveis diferenças é que o Budismo, em contraste outras culturas religiosas, não tem uma “história da criação ou origem do mundo”.

Ao invés de ser uma história sobre o drama da origem e do homem e de sua condição, o Budismo conta a história do próprio Buda, este homem particular e sua compreensão do mundo como ele é.

Enquanto o tempo passa, Buda cresceu intencionalmente protegido por seu pai, um rei. Buda foi protegido de ver qualquer morte, doença ou feiura. Ele foi criado rodeado de beleza, juventude e prazer. Porém, em um de seus passeios fora do Palácio, contemplou quatro sinais que o chocariam para sempre: uma pessoa doente, um idoso, uma pessoa morta e um asceta hindu.

A história do Buda não é sobre um homem que viveu há 2500 atrás. Provavelmente, a questão é que talvez, não seja nem necessário saber. A história do Buda é sobre uma pessoa que cresce e contempla o mundo ao seu redor. 

Crianças são geralmente protegidas do que chamamos “realidade da vida”. Para eles, tudo é divertido e aparenta que a diversão nunca terá fim. Assim que crescem, percebem que a vida não é somente jogos e diversão. Eles observam a vovó ficar doente e percebem que um dia também ficarão doentes. Quando sua avó querida falece, conseguem compreender que um dia também irão deixar este mundo.

Essas reflexões podem não ser tão grandes e profundas como as que ocorrem na história do Buda, mas são realizações que todos os seres humanos um dia irão enfrentar.

A essência do sofrimento

A história da criação pelo Cristianismo, nos capítulos de abertura do livro de Gênesis, providencia a mesma lógica e poderia ser facilmente aplicado como uma alegoria ao que todos experimentam quando o envelhecimento se aproxima.

Adão e Eva, os primeiros humanos, viviam em inocência e de repente, comeram o fruto da árvore do “conhecimento do bem e do mal”. Como resultado, eles foram expulsos do Paraíso; sofrimento, dor, enfermidade e morte entraram em seu mundo. Eva, a mulher, lhe foi dito que teria filhos apenas com muita dor, se tornou adulta. Adão, o homem, lhe foi dito que conseguiria alimento para ele e sua família apenas com muito trabalho sem fim, se tornou adulto. A mais profunda sentença lhes foi lançada: “Vieram do pó e ao pó retornarão” (Gênesis 3:19).

A história da criação pelo Budismo e pelo Cristianismo são muito diferentes em tempo, lugar e pessoa. Mas a mensagem continua a mesma: agora que atingimos a idade adulta, temos que encarar os fatos: ficaremos facilmente doentes, velhos e a morte nos espera. Ao mesmo tempo, em ambas as crenças, há um raio de luz que resplandece sobre tudo isto.

Na história budista, o Buda encontra o asceta hindu, que busca um caminho para vencer a enfermidade, velhice e a morte. Na história cristã, o Senhor diz a serpente que Ele põe “inimizade entre ela e a mulher, entre a sua descendência e o descendente dela; esta ferirá a sua cabeça, e a serpente lhe ferirá o calcanhar” (Gênesis 3:15).

Deus prometeu uma semente à Eva, Um que viria para destruir a serpente, desfazendo as consequências da queda e salvando a humanidade da enfermidade, velhice e morte.

As respectivas histórias fundamentais do Budismo e do Cristianismo continuam, cada um recontando os eventos que são muito diferentes uns dos outros e possivelmente difíceis de se entrelaçar na mesma verdade. 


Se há um elemento particular nas duas crenças, e que pode ser encontrar por todo o Antigo Testamento, é que o homem constantemente busca a divinização e falha sempre. Uma das histórias mais peculiares de todo o Antigo Testamento que dura por milhares de anos, é sobre a impossibilidade do homem em atingir a divinização e restaurar sua comunhão com Deus.

A moral que se prossegue na história do Buda é praticamente a mesma. Após observar os quatro sinais, Buda abandona o Palácio de seu pai e retira-se para a floresta para viver com o asceta hindu, lutando junto com ele para fugir da enfermidade, velhice e morte.

Durante este tempo, absorve a sabedoria de muitos gurus e põe as técnicas todas em prática. Ele atinge um profundo estado místico. E mesmo assim, não está satisfeito com seu progresso.

Ele continua sofrendo, continua ficando doente, envelhecendo e também terá que enfrentar a morte. Retorna ao ponto zero. Ele jejuou tanto e torturou seu corpo físico de tal maneira que textos budistas recordam que ao tocar seu estômago, encostava na espinha.

Finalmente, ele senta na posição de Lótus abaixo de uma árvore e torce para não precisar se mover até que morra ou alcance a iluminação, então medita.

Como o próprio nome “Buda”, que significa “O Iluminado”, indica, ele atingiu seu objetivo, alcançou a iluminação e experimentou o Nirvana, o estado de não-sofrimento. Atingindo seu objetivo, ensinou os outros a alcançar este caminho. Seu primeiro sermão, dado a amigos ascetas que o haviam seguido, ressaltam as verdades mais profundas que o Buda encontrou, verdades que se encontram nos fundamentos da fé Cristã Ortodoxa.

Estes ensinamentos são chamados “Quatro Nobres Verdades” e os “Oito Caminhos”.

1º Nobre Verdade

A primeira das nobres verdades é que o sofrimento está presente em todos os aspectos da vida; até a mais preciosa alegria eventualmente sumirá porque na terra tudo é temporal.

De acordo com Buda: “Agora, ó monges, está a nobre verdade da dor: nascer é doloroso, envelhecer é doloroso, adoecer é doloroso, lamentar-se e chorar é doloroso. Contato com coisas desagradáveis é doloroso, não atingir o que se quer é doloroso. Apegar-se é doloroso”.

Isto, como já observamos, é similar ao ponto de início do Cristianismo. Retornando ao terceiro capítulo do livro de Gênesis, encontramos o mesmo conteúdo nas palavras de Deus para Adão e Eva após a queda:

“E à mulher disse: Multiplicarei grandemente a tua dor, e a tua conceição; com dor darás à luz filhos; e o teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará. E a Adão disse: Porquanto deste ouvidos à voz de tua mulher, e comeste da árvore de que te ordenei, dizendo: Não comerás dela, maldita é a terra por causa de ti; com dor comerás dela todos os dias da tua vida. Espinhos, e cardos também, te produzirá; e comerás a erva do campo. No suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra; porque dela foste tomado; porquanto és pó e em pó te tornarás” (Gênesis 3:16-19).

Após estabelecer esta verdade fundamental, tanto o Cristianismo como o Budismo contemplam que o sofrimento é inevitável e faz parte da condição humana atual.

2º Nobre Verdade

A segunda nobre verdade é que o sofrimento é causado pelo desejo (tanha). Desejar, entretanto, não é uma palavra tão bem traduzida para o significado profundo que dela Buda estabeleceu. A melhor palavra equivalente seria o termo grego “pathos”, usado pela Igreja Ortodoxa para designar “paixões”. Tanto a “tanha” como o “pathos” se referem as emoções que dominam (e escravizam) as almas dos seres humanos.

Buda listou três formas de “tanha”:

1. Desejo por prazer
2. Desejo por existência
3. Desejo por não existência

Os primeiros monges cristãos compilaram uma lista de paixões (pathos), oito em número (que mais tarde foram tratados no ocidente como os “sete pecados capitais"):

1. Paixão da Gula
2. Paixão da Luxúria
3. Paixão da Cobiça
4. Paixão da Ira
5. Paixão da Melancolia
6. Paixão da Preguiça
7. Paixão da Vanglória
8. Paixão do Orgulho

Como podemos ver, apesar do conteúdo ser apresentado de forma diferente, a mensagem é similar. Essas paixões/desejos são a razão para o sofrimento humano.

3º Nobre Verdade

A Terceira Nobre Verdade de Buda é que há um Caminho pelo qual podemos superar o sofrimento, superar a enfermidade, superar o envelhecimento e a morte. Da mesma forma está de acordo com o Cristianismo.

4º Nobre Verdade

É finalmente, com a quarta Nobre Verdade que o Cristianismo e o Budismo encontram uma distinção. Na verdade, acredito que a quarta Nobre Verdade de Buda, na qual ele estabelece o meio pelo qual o sofrimento pode ser superado, não está incorreto, mas incompleto.

Buda ensina, na quarta Nobre Verdade, que o caminho para superar os desejos é possível através dos “Oito Caminhos”:

1. Compreensão correta
2. Pensamento correto
3. Fala correta
4. Ação correta
5. Meio de vida correto
6. Esforço correto
7. Atenção correta
8. Concentração correta

Em tudo isto, Buda estava correto. Seguir estes passos pode nos levar ao nirvana, o estado do não-sofrimento e a iluminação.

Mas apesar de todo o esforço, jamais destruiriamos a enfermidade, a velhice e a morte. Segundo a história, o Buda morreu aos 80 anos por uma doença resultada ao comer um pedaço de carne de porco. Em outras palavras, mesmo iluminado, ele envelheceu, adoeceu e faleceu.

Todavia, após 500 anos de sua vida, algo notável aconteceu, um evento chave foi inserido na história humana, que Buda, por sua condição e localização histórica, estava distante: 

Deus se tornou Homem.

Ele nasceu, foi crucificado, morreu, e ressuscitou.

Com isto, nos possibilitou a Theosis, ou divinização, através dela surge a esperança de que a morte, a velhice e a enfermidade serão abolidas. Devemos continuar com a sabedoria de enfrentar nossas paixões ou desejos, porém há uma nova dinâmica: a Graça Divina.

A partir disto, compreende-se que nossas lutas não serão apenas para nos elevarmos acima de uma condição humana menos aprimorada para mais aprimorada, mais que isso, com a graça de Deus ter se tornado Homem, Ele nos possibilitou que nós nos tornemos Deus, ou seja, sejamos elevados a Sua natureza pela graça. O homem pode se unir misticamente e viver nEle, onde a velhice, a dor e a morte foram abolidas.

O pensamento budista, portanto, não está em nada incorreto, somente incompleto.

O Buda é um homem notável e digno de veneração por ter compreendido com sabedoria a natureza do mundo, da humanidade e da possibilidade de iluminação predita pelos antigos e sábios filósofos.

Esta é uma conquista verdadeiramente incrível da parte dele, já que ele estava distante geograficamente até mesmo da revelação de Deus dada a Israel no Antigo Testamento. Não é à toa que até os Pais da Igreja dos primeiros séculos deram o reconhecimento da santidade de Buda, assim como reconheceram nos filósofos gregos e os profetas de Israel.

Buda, sem dúvida, pode ser contado entre aqueles que eram “cristãos antes de Cristo”.

Jesus Cristo, porém, é a conclusão do grande dilema que o Buda tentou resolver, finalmente, Cristo é o cumprimento da nobre verdade do budismo e não sua oposição.

"Toda a pessoa, instintivamente, se esforça para a felicidade. Este desejo foi implantado em nossa natureza pelo próprio Criador, e, portanto, não é pecado. Mas é importante entender que nesta vida temporária é impossível encontrar a felicidade plena, pois que vem de Deus e não pode ser alcançado sem ele. Só Ele, que é o último bem e fonte de todo o bem, pode saciar a nossa sede de felicidade." - Santo Inocêncio de Alaska, indicação do caminho para o Reino dos Céus.

- Tradução do artigo de David Withun: "The Truth of Buddhism".

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Ortodoxia e a Divinização do Homem


A divinização é uma verdade latente da humanidade, recontada pelos mais diversos mitos, infelizmente é desfigurada pelas mais variadas formas desde a antiguidade até os tempos pós-modernos. Numa busca desesperada e falha, como conta o mito grego de Prometheus, o homem encontra formas de divinizações que o levam a sua própria condenação. Contudo, há um arquétipo e uma possibilidade verdadeira.

Na Sagrada Tradição da Igreja Ortodoxa de Cristo, o homem pode alcançar a Theosis, ou seja, divinização. Isto porque de acordo com os ensinamentos bíblicos e patrísticos, a graça é incriada. Deus não é apenas essência como dizem os cristãos ocidentais, mas também energia.

Diferença entre Essência e Energias


Se Deus fosse apenas essência, ninguém poderia se unir a Ele, ou viver em comunhão com Ele, porque a essência divina é inacessível ao homem, pois o Senhor declara: "Não me poderás ver a face, porquanto homem nenhum verá a minha face e viverá." (Êxodo 33:20).

Vamos utilizar uma analogia bem prática e humana. Se tocarmos um cabo elétrico, morreremos. Por outro lado, se conectarmos isto a uma lâmpada, utilizaremos a luz e seremos iluminados. A energia da corrente elétrica pode então ser observada, apreciada e ela nos auxilia. A essência não podemos portar. Algo similar acontece com as energias incriadas de Deus.

Se pudéssemos estar conectados com a essência de Deus, também nos tornaríamos deuses em essência. Nominalmente, tudo se tornaria divindades, haveria uma confusão, e portanto, nada seria divindade. Por nome, isto é o que acreditam algumas religiões orientais, como o Hinduísmo, onde a personalidade divina não existe, mas sim, uma essência vaga, dispersa pelo cosmos, nas criaturas humanas como também nos animais e matéria (Panteísmo).

Da mesma forma, se Deus tivesse apenas uma essência incomunicável sem Suas energias, Ele seria um Deus autossuficiente, fechado em Si mesmo e sem comunicar-se com Sua criação.

É com suas energias incriadas que Deus criou o mundo e continua a sustenta-lo. Ele concede essência e existência ao nosso cosmos com suas energias incriadas, porém criadoras. Ele está presente na natureza e sustenta o universo com Suas energias. Ele ilumina o homem com suas luminosas energias. Ele santifica o homem com suas santificantes energias. E finalmente, diviniza o homem com suas divinas energias. É com tais energias, que o Santo Deus permeia a natureza, o mundo, o cosmos, a história e a vida dos humanos.

As energias de Deus são energias divinas. Elas são também Deus, sem deixar de ser Sua essência. Por serem divinas é que tornar o homem divino. Se as energias não fossem divinas, então elas não seriam Deus, não nos divinizaria nem nos uniria a Ele. Haveria finalmente, uma gigantesca distância entre o Criador e Sua criação.

Do contrário, como crê a fé ortodoxa: Deus tem suas energias e nos possibilita unirmos a ela, e a isto se refere a Sua Graça. Nos unimos a Ele, nos tornamos um com Ele e não um como Ele, caso nos uníssemos a Sua essência e não as energias.

Nós, portanto, nos unimos a Deus através de suas energias incriadas, e não através de Sua essência. Este é o mistério que envolve toda a criação, toda a fé cristã ortodoxa e toda a vida humana.

Isto, a falácia ocidental não pode aceitar. Por quê? Por que são racionalistas e não podem diferenciar entre essência e energia e ao mesmo tempo continuar crendo que Deus é incriado. Por este motivo, não há no discurso cristão ocidental a Theosis (divinização) do homem. A questão deles é de que o homem não pode se tornar Deus porque não podem imaginar energias incriadas, mas somente energias criadas. Isto significa: como pode algo criado, “fora de Deus”, tornar Deus o homem criado?

São Gregório Palamás e o pensamento ortodoxo


Durante o século 14, aconteceu uma grande confusão na Igreja Ortodoxa, que iniciou-se com um monge ocidental, chamado Varlaam. Ele ouviu em algum lugar que os monges atônitas (do Monte Athos) estavam discursando sobre Theosis. Ele foi informado que através da constante oração, se uniam a Deus e podiam até mesmo vê-Lo. Ouviu até mesmo que podiam ver a luz incriada que foi vista pelos Apóstolos na Transfiguração de Jesus Cristo no Monte Tabor.

Entretanto, Varlaam, tendo seu espírito permeado pelo racionalismo occidental, não percebeu a genuína experiência divina destes humildes monges e começou a acusa-los de loucura, heresia e idolatria. Varlaam chegou a afirmar, por exemplo, que era impossível aproximar-se e ver a Graça Divina, porque ele (Varlaam) não sabia nada entre a diferença da essência e das energias incriadas de Deus.

Na mesma época, a Graça Divina trouxe um grande e iluminado mestre para a Igreja: São Gregório Palamás, Arcebispo da Tessalônica. Com grande sabedoria e iluminação por Deus, e também por experiência mística pessoal, ele escreveu centenas de textos ensinando, através das Sagradas Escrituras e da Sagrada Tradição da Igreja, que a luz incriada da Graça de Deus, citado por São Paulo em suas cartas, são na verdade as energias divinas.

São Gregório Palamás defendeu que os monges que haviam visto a luz divina haviam sido divinizados (através da Theosis). Esta é a glória de Deus: a luz da Transfiguração no Monte Tabor, a luz da Ressurreição de Cristo, a graça do Pentecostes e até mesmo a iluminada nuvem citada no Antigo Testamento.

As energias divinas são, na teologia ortodoxa, reais e místicas e não somente simbólicas como Varlaam falsamente acreditava.

Em continuação a isto, a Igreja reunida em três grandes Sínodos na cidade de Constantinopla, glorificaram (canonizaram) São Gregório Palamás e declararam o real objetivo da vida em Cristo, que não era a moralização do homem, mas a sua divinização, onde o homem participa da graça de Deus de forma plena.

Conclusão


Até hoje, ocidentais consideram as energias divinas como cousas criadas e não incriadas. Isto é infelizmente uma das reais diferenças entre Ortodoxia e Heterodoxos, devendo ser levado a sério no diálogo teológico. Assuntos como a “Filioque”, primazia e “infalibilidade” papal e outros dogmas latinos são apenas a ponta do iceberg.

Se cristãos ocidentais não aceitam que a Graça de Deus é incriada, jamais poderemos tomar do mesmo cálice, mesmo que acreditassem em todas as outras coisas. Pois, quem pode divinizar o homem, senão o “Deus que se tornou o que somos para que pudéssemos nos tornar o que Ele é?”.

- Tradução do artigo "Theosis, o objetivo da vida humana.", escrito pelo Arquimandrita George, Ábade do Monastério de São Gregório no Monte Athos, Dezembro, 2006.

terça-feira, 4 de junho de 2013

O Confessor dos Astronautas

Benção das naves espaciais por um padre ortodoxo

"A exploração do espaço está de acordo com a vontade divina,
pois elas proporcionam ao homem 
a oportunidade de explorar a si mesmo."
- Sua Beatitude, Patriarca Cirilo de Moscou e toda a Rússia

"Você viu Deus lá?" - Tal pergunta, por vezes sarcástica, por vezes curiosa e inocente, é constantemente repetida aos astronautas de missões espaciais assim que retornam à Terra. A resposta dos americanos é simples e ficou marcada na história: "Não O vimos, mas contemplamos Seus rastros.".

Astronautas russos, por sua vez, não podiam conceder respostas do gênero na ateísta União Soviética, onde  religião era o "ópio do povo" e Deus "não existia".

Hoje, numa Rússia com liberdade religiosa, as condições são diferentes e os astronautas podem ter seus próprios pais espirituais e confessores, pelos quais podem se comunicar a qualquer momento diretamente do espaço, antes, durante ou depois de sua estadia no espaço.

Para o padre ortodoxo Job Talats, estes destemidos astronautas são pessoas que tem suas próprias questões e também se perguntam como Deus estabeleceu o Universo.

Pároco da Igreja Ortodoxa da Transfiguração, padre Talats regularmente visita o Cosmódromo de Baikonur, de onde missões espaciais são lançadas. Lá, ele prepara espiritualmente os astronautas para a longa jornada e também os recebe de braços abertos quando retornam, para que possam agradecer ao Senhor pela experiência. 

"Quando o homem está no espaço sideral, ele pode contemplar a majestade do Universo e se aproximar ainda mais do Seu Criador.", comenta o padre.

"Não O vi, mas contemplei Seus rastros."

Crucifixo da Estação Espacial Russa (ROSCOSMOS)

O padre ressaltou que o astronauta americano, Frank Borman, o primeiro homem a ver de perto a lua, em certo momento, após um prolongado silêncio, sussurrou: "No princípio, Deus criou os céus e a terra. A terra está vazia e informe...". Primeiro verso do livro de Gênesis, primeiro livo das Sagradas Escrituras. Muitos dos companheiros da missão espacial não conseguiram conter as lágrimas. Quando retornou à terra, foi questionado: "Você viu Deus lá?", e ele respondeu: "Não, eu não O vi, mas contemplei os Seus rastros.".
Estes "rastros" que Borman contemplou agora parecem ser também contemplados por seus colegas russos, conforme explica o padre Talats:
Os astronautas me ligam antes das decolagem, pedindo por orações e bençãos. Yuri Lonchakov, comandante espacial, chegou a ler a Bíblia inteira durante o período que esteve no espaço. Durante as últimas horas antes do voo, conversávamos sobre assuntos teológicos, interpretação ortodoxa da criação, como os santos compreendiam a natureza do cosmos e afins. Oleg Skripinchko cumprimentou o Patriarca de Moscou diretamente do espaço, quando Sua Beatitude visitou o Centro Espacial. Outro, Fyodor Turchikhin, de origem grega, permaneceu seis meses na órbita da terra e levou consigo relíquias de São Teodoro, o Comandante.
"Meu Deus, porque retornei à terra?"

Ícone da Theotokos acoplado na parede da Estação Espacial Russa (ROSCOSMOS)
De acordo com o padre Talats, cada astronauta adquire suas próprias experiências no espaço. "Você não pode explicar isto. Não pode-se explicar o que se sente, porque pessoas são diferentes e vivem experiências variadas. Um astronauta, Valery Oliagov, ficou em torno de um ano e três meses na Estação Espacial, é um campeão e recordista. Durante o período na Estação Espacial, ele celebrou a Páscoa e até mesmo cantou o tropário da Ressurreição, cheio de júbilo. Quando retornou, se deparou com os problemas diários e a realidade terrena, chegando a se questionar, meio sarcástico, meio brincando: "Meu Deus, porque retornei à terra?".

- Retirado e traduzido parcialmente e livremente do artigo: "The confessor of the Astronauts - Fr. Job Talats: «In Space you can see the Grace of God»", entrevista do jornal grego TO VIMA.